Em uma tarefa simples na cozinha, a costureira Maria Gorete Puhl, 41, se acidentou. Foi durante um evento para mulheres na casa dela, na hora de descartar o óleo quente dos pastéis fritos, que a moradora de Cruzeiro do Sul sofreu uma queimadura grave na mão direita, e a por tratamento ainda hoje, mais de dois meses depois.
Os acidentes domésticos são os mais comuns e representam 70% dos casos de queimaduras no país. Por isso, a Sociedade Brasileira de Queimaduras (SBQ) promove o Junho Laranja, focado na prevenção.
Podendo ser de primeiro, segundo ou terceiro grau, as queimaduras exigem cuidado diário. Foi assim para Maria Gorete. Por uma semana, ela ia todos os dias ao hospital para trocar os curativos.
Também tem acompanhamento de dermatologista e utiliza uma luva compressiva que ainda protege a mão de possíveis bactérias, além de tratar com medicamentos e pomadas. As dores surgem de vez em quando, mas a recuperação, devido aos cuidados, tem sido rápida.
Contexto de violência
Neste ano, a campanha Junho Laranja tem como tema a violência contra a mulher, com o slogan “Marcas no corpo, feridas na alma”. Pensando nisso, a Univates sedia, no dia 6 de junho, um evento para tratar o assunto. O momento conta com palestra sobre primeiros socorros e prevenção de queimaduras, além de uma apresentação teatral dirigida por Anderson Balhero.
Entre os palestrantes, está o médico Francisco Tostes. O profissional destaca que, no contexto da violência doméstica, muitos casos de agressões com fogo, álcool ou produtos químicos, como soda cáustica, não são documentados.
“Dados mostram que apenas cerca de 30% das mulheres que sofrem agressões chegam a procurar ajuda. Não temos uma estatística precisa, e a SBQ trabalha para melhorar esse mapeamento”, relata.
A maior parte dos casos de queimaduras ocorre dentro de casa, especialmente na cozinha. Água fervente, óleo quente e acidentes com gás estão entre os principais vilões. No Rio Grande do Sul, é comum o registro de queimaduras com água do chimarrão, principalmente em crianças.
Bebês também exigem cuidado especial. “A pele dos bebês é muito fina e sensível. Um erro na temperatura da água do banho ou na papinha pode causar queimaduras graves”, destaca Tostes.
Orientações
Uma vez que ocorre uma queimadura, a orientaçẽo, segundo o médico, é colocar o ferimento em água corrente para aliviar o calor. “Nada de ar creme dental, margarina, borra de café ou clara de ovo. Isso não ajuda e ainda pode agravar o ferimento”, reforça.
O próximo o é proteger a área com uma pano ou gaze limpa e procurar atendimento médico. Segundo Totes, a perda da camada de proteção da pele leva à rápida desidratação do paciente. “A hidratação é fundamental no atendimento inicial. É a perda de líquidos que pode levar o paciente a óbito, dependendo da extensão da queimadura”, explica.
Desafios na cicatrização
Depois do atendimento inicial, há um caminho desafiador para a cicatrização do ferimento. Tostes explica que no ado era comum deixar a ferida secar. Hoje, o ideal é mantê-la úmida e protegida, com o auxílio de curativos, que estão cada vez mais modernos, capazes de acelerar a cicatrização e reduzir o risco de infecções.
“Se a ferida ficar aberta, além de secar, ela se contamina com facilidade. O ideal é que esteja sempre coberta e hidratada”, orienta o médico.
Em muitos casos, as cicatrizes precisam ser tratadas por anos, com o uso de malhas compressivas, muitas vezes associadas a silicone, para evitar o desenvolvimento de queloides, cicatrizes elevadas e endurecidas.
“O paciente queimado é, muitas vezes, um paciente para a vida toda. As cirurgias reparadoras são frequentes, e a busca por melhorias na aparência e na funcionalidade nunca termina.”
Prevenção
Médico clínico geral, Aluísio Neutzling afirma que as causas de queimaduras são repetitivas, por isso a importância da prevenção. Crianças estão entre as principais vítimas. Nesses casos, as queimaduras podem ocorrer ao puxarem toalhas da mesa com as quentes, alcançarem cabos de a virados para fora do fogão ou se queimarem com líquidos ferventes.
“No nosso inverno rigoroso, outro risco recorrente é o uso de vasilhas com álcool para aquecer ambientes, o que frequentemente gera acidentes com adultos e crianças. E há também os acidentes na hora do churrasco, quando se utilizam substâncias inflamáveis para acender o fogo, provocando explosões”, alerta.

Os acidentes domésticos são os mais comuns e representam 70% dos casos de queimaduras no país. (FOTO: ENVATO DIVULGAÇÃO)
Riscos à saúde
O profissional diferencia os tipos de queimadura e explica que a de primeiro grau é mais superficial, como a queimadura de sol, que deixa a pele vermelha e ardida. A de segundo grau provoca bolhas e atinge camadas mais profundas da pele. Já a de terceiro grau é mais grave e atinge tecidos profundos.
“Queimaduras por choque elétrico, por exemplo, são extremamente perigosas. Além da queimadura visível na pele, podem gerar lesões internas nos músculos, liberando substâncias tóxicas que sobrecarregam os rins e podem levar à insuficiência renal”, explica o médico.
Outro risco é a inalação de gases quentes durante explosões. “Quando a pessoa abre a boca no susto, pode inalar o gás quente, queimando as vias respiratórias, especialmente a laringe, levando à obstrução e risco de morte se não houver socorro imediato.” Além disso, feridas mal cuidadas podem evoluir para infecções graves, que em casos extremos podem levar a uma infecção generalizada.
“Queimaduras são acidentes que deixam marcas profundas, físicas e emocionais, e em muitos casos podem ser evitadas com atenção e cuidados básicos”, destaca.
A Sociedade Brasileira de Queimaduras afirma que as queimaduras térmicas são a principal causa de morte, seguida pelas queimaduras elétricas. A SBQ também destaca a importância da prevenção e a necessidade de políticas públicas para reduzir a incidência.